Thursday, June 21, 2007

Ferrugem no horizonte

Uma das dores na vida de um cristão é a diferença de objectivos nessa mesma vida. Um cristão necessariamente acha secundário coisas como ganhar uma partida de futebol, torcer e celebrar vitórias da selecção nacional de futebol, tirar um curso universitário, casar, ver os filhos casarem-se, ser aumentado no ordenado, comprar um carro novo, ter uma reforma que dê para passear, sobreviver a um acidente, a morte de um familiar, e por aí em diante. A análise fria não pode deduzir muito mais para além disto. No fim, há os que se salvam e os que não se salvam, e o resultado desta partida é o disparatadamente mais importante de todos. E Jesus dizia para não ajuntarmos tesouros na terra onde a traça e a ferrugem consomem, e só um evangélico baptista americano da linha dura de entre os fundamentalistas é podia pensar que Jesus estava a falar apenas em brincar aos tesouros dos piratas (enterrar literalmente moedas debaixo do chão). Até porque depois, seguem-se os tesouros que devemos ajuntar, no Céu, onde não há traças nem ferrugem.

Se por acaso o sorriso do cristão não for suficientemente rasgado quando o seu amigo não crente tirar o curso, não deve ser levado a mal. Há uma alegria possível e sincera na alegria do próximo. Mas a tal análise fria relembra que no fundo, só está a enterrar o tesouro um pouco mais fundo.

Thursday, June 07, 2007

Desancar Dawkins 2

Um Dawkins deve estar para um Hawking, assim como um fato de treino Reelook para um fato de treino Reebok.

Desancar Dawkins 1

Quando fui visitar o site do Richard Dawkins, era porque pensava que lá encontraria a vanguarda dos inimigos da fé religiosa. De certo modo, foi isso que encontrei, mas apenas numa segunda análise. Eis um exemplo:


What is your opinion about Stalin and Hitler as atheists?
I have said in my book that Hitler was not at all atheist, as he was religiously biased against Jewish people. Stalin was following communism dogmatically. (…) Being atheist does not ask you to become dogmatic or atheist (…)

Convido a reparar como ele descarta da sua tendência os elementos conhecidos por serem menos amistosos. É como o Beto e alguns benfiquistas. Se alguém seguir ao ateísmo como deve ser, é ateu. Se for pecador, é lançada para fora da cidade.
E este direito é universal?


You ignore the best of religion and instead you attack crude, rabblerousing chancers like Ted Haggard, Jerry Falwell and Pat Robertson, rather than facing up to sophisticated theologians like Bohnhoeffer and the Archbishop of Canterbury.

If subtle, nuanced religion predominated, the world would be a better place and I would have written a different book. The melancholy truth is that decent understated religion is numerically negligible. (…)

Não, os religiosos já têm de pagar pelos maus religiosos. A religião tem de se preocupar com os efeitos práticos (não utópicos, claro) da sua existência no mundo, enquanto que o ateísmo só tem de se preocupar com os efeitos práticos da religião no mundo. E com os possíveis efeitos do ateísmo no mundo.

É demasiado fácil achar buracos na argumentação de Dawkins. Este sim é o perigo da sua argumentação, a vaidade que possa surgir quando é tão fácil dar troco à argumentação de um físico. É o problema da falta de exercício, porque, como diz a máxima, uma mente desocupada é a oficina do Diabo. No dia em que um cristão se recusar a discutir estas coisas só porque acha que vai ser uma perda de tempo, tornou-se menos cristão.

Friday, June 01, 2007

Blogues, choque, divagação, conclusão

Quando cheguei aos blogues, fui tomado por um entusiasmo desmedido entusiasmo. Finalmente, encontrar não uma ou duas, mas várias mentes que pensavam mais ou menos como eu e tinham chegado a uma mesma meia dúzia de conclusões que, penso eu, são parte estruturante da formação da personalidade de uma pessoa. Não foi só gostar, foi sentir identificado.

Mas também houve alguns choques de frente. Como por exemplo o apoio à guerra no Iraque, e até mesmo ao próprio Bush. Ou o desinteresse, e até mesmo desprezo por escritores alguns escritores que o meu critério imparcial consideraria bons (sim, a conjugação do verbo no conjuntivo foi premeditada). Chegar a um mundo que desaprova “A Gaivota E O Gato Que A Ensinou A Voar” (embora nunca o tenho visto escrito, é fácil concluir que sim), do Luís Sepúlveda foi e ainda é duro. Descobri um cepticismo europeu que não imaginava existir. E há o caso das pessoas que não são ateias nem religiosas, e que até aceitam a ortodoxia dos religiosos, e no entanto, passados mais de dois anos, começaram a saber-me a um veneno de efeito mais lento do que o ateísmo militante.

Todas estas coisas a que não me habituei são para mim como tentar encaixar os legos nos pinipons. O meu organismo ainda as considera antinaturais, o que me faz periodicamente regressar à temática da sinceridade. Palavra que quando me lembro das pessoas que apoiavam o Bush, ocorria-me muito mais perguntar-lhe as motivações do que os argumentos.

E claro que isto também me leva a perguntar-me sobre a hipótese que temos ou não de contrariar a educação – questionar ainda vai, agora contrariar parece-me mesmo difícil. Se existe alguém a apoiar Bush e a minha mente não só me impede de imaginar tal coisa, mas até mesmo de a aceitar, pode-se dizer que sou uma pessoa pouco criativa e não muito inteligente, mas não abarco a totalidade das culpas e afirmo que a educação é mesmo muito poderosa.

Parece-me que questioná-la deve ser um exercício contínuo, mas perco-me no ponto de levar a cabo as conclusões. É neste ponto que saem as máximas “quem não arrisca não petisca”, “a sorte sorri aos audazes”, ou no meu meio “deixemos o Espírito Santo trabalhar em nós”.