Monday, November 17, 2008

Sem qualquer alfinetada

“Monsieur Laplace, they tell me that you have written this large book on the system of the universe, and have never mentioned its Creator”. To this Laplace replied bluntly, “I had no need for that hypothesis.”

Da primeira vez que li este episódio, fiquei com aquela sensação que leva a sorrir. Aquela sensação de assistir a um excelente golpe de retórica, do tipo facto envenenado. Que inteligência generosa! Reduzir Deus a uma hipótese, a um dado de input, mas mostrar que até nessa categoria, a ideia da existência de Deus é desnecessária, ridicularizando que sequer considere essa “hipótese”.

Há pouco tempo tive hipótese de perceber um nadinha melhor o que foi ao certo a escrita deste tal livro de Laplace. Deu para perceber que esta resposta brilhante foi afinal também inevitável, sem grandes considerações sobre quem o ouvia. Já não lhe consigo achar grande retórica. Era um livro no qual Laplace explicava o movimento de quase tudo o que mexia, recorrendo à mecânica clássica de Newton. De facto, ele não precisava de Deus para explicar o movimento dos planetas ou a mudança das marés. Não havia qualquer alfinetada.

Não sei se a retórica foi sempre a mesma, mas aquela a que assisto parece baseada neste episódio. É aquela que com meia dúzia de palavras atribui ao retórico uma vida inteira de credibilidade. Com uma generosidade imensa de palavras confiantes, persuadimos ou público a confiar em nós. Não predomina o argumento falacioso, apenas o crédito. No debate das ideias, ganha quem mostrar ter menos roupa suja.

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